sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Histórias da Casa Branca: a América quer mesmo mudar

TEXTO PUBLICADO NO TV2I24, A 24 DE JANEIRO DE 2013:

David Brooks chamou-lhe «um dos melhores discursos de posse do último meio século americano». A inauguração do segundo mandato de Barack Obama foi, ao mesmo tempo, rica e surpreendente. 

A tradição aponta para que os discursos de posse sejam generalistas e neutrais. A parte mais política costuma ser reservada para os discursos do Estado da União.

Com uma carga mais simbólica, as tomadas de posse costumam apelar aos valores fundadores do sistema e menos para a a parte ideológica. 

Mas Barack Obama deu claro sinal de que não quer perder tempo. Legitimado pela reeleição, fez questão de se antecipar ao que vai dizer a 12 de fevereiro, no Estado da União.

Obama começou por destacar valores fundadores e apelar à união, ao repetir, nos primeiros minutos: «Somos um só povo, uma só nação». Mas já aí estava a remeter para uma ideia que dominou a reta final da reeleição. Obama envolveu os riscos que a América corre na força que aquele país continua a mostrar na hora da adversidade: «Somos América», insistiu.

O mais surpreendente viria a seguir. «A nossa jornada não está completa», lançou, como que a avisar para o registo que apareceria de seguida.

«Uma década de guerra terminou. A economia está a recuperar. As possibilidades da América são ilimitadas. Temos todas as condições para responder aos desafios que se nos deparam. O risco é, para os Estados Unidos, uma oportunidade para nos reinventarmos, para a inovação». 

«Quando os tempos mudam, nós também temos que mudar», exortou o Presidente. A deixa ideal para enunciar prioridades para o segundo mandato: reforma da imigração mais compreensiva; criar condições para que os EUA sejam uma superpotência energética e caminham para a independência nessa área central; endereçar soluções que travem o risco das alterações climáticas; proteger a sustentabilidade de programas cruciais para milhões de americanos, como o Medicare e o Medicaid.

Obama fez história ao ser o primeiro Presidente a dizer a palavra «gay» num discurso de posse. No segundo mandato, estará menos preocupado em criar equilíbrios com o o outro lado e pretende assumir as suas posições ideológicas. 

A base democrata adorou. Sentiu, finalmente, que Obama lhe disse: «Vocês elegeram-me. Sou o vosso Presidente». 

Terá sido um Obama mais liberal, menos centrista? Não, necessariamente. Foi, certamente, um Obama a mostrar que pretende aproveitar a segunda fase dos oito anos da sua era na Casa Branca para avançar com temas que sempre considerou essenciais para a sua visão da América e do Mundo: a inclusão social; a tolerância para com a diferença; a noção de que «somos todos iguais, somos todos irmãos e temos a obrigação de nos ajudar e proteger». 

Há quatro anos, Barack Obama tomava posse num clima de profunda emoção (era notável que um negro estivesse a prestar juramento como Presidente dos EUA), mas também num ambiente de medo (o sistema financeiro estava a dias de poder colapsar).

Quatro anos depois, a Economia continua com problemas, mas Barack Obama iniciou o caminho da «longa estrada da recuperação»: os custos de guerra estão a baixar, o desemprego está a descer há três anos seguidos.

Mesmo com um Congresso politicamente dividido, parece haver, finalmente, condições para que o Presidente consiga impor a sua agenda num clima de relativa normalidade. 

O segredo do exceexcelente discurso da segunda posse de Obama foi juntar, em menos de 20 minutos, o respeito pelos equilíbrios do sistema com a clara assunção sobre de que lado está o Presidente.

Barack Obama tem, na prática, dois anos para para definir o sucesso do seu segundo mandato. A partir do outono de 2014, as atenções estarão focadas nas eleições intercalares e, obviamente, na sua sucessão na Casa Branca.

Chegou o tempo da concretização. E tudo indica que isso será bom. 

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