terça-feira, 27 de novembro de 2012

Histórias da Casa Branca: fujam do precipício orçamental

TEXTO PUBLICADO NO TVI24.PT, A 26 DE NOVEMBRO DE 2012:

Barack Obama venceu o desafio da reeleição, mas não teve muito tempo para festejar. Os Estados Unidos caminham para um «precipício orçamental» que ameaça, no primeiro dia de 2013, atirar a maior potência mundial numa espiral recessiva ainda pior do que a que se vive na Europa.

Evitar a «fiscal cliff» é a primeira grande missão do Presidente reeleito. Se, até 31 de dezembro, Casa Branca e Congresso não chegarem a um acordo que permita prorrogar os cortes fiscais que terminam no final do ano e minimizar os efeitos dos cortes na despesa (já aprovados no Orçamento de 2011 e que estão previstos entrar em vigor em 2013), a economia dos EUA perde, de um dia para o outro, cerca 700 mil milhões de dólares.

Este é um valor tão gigantesco que quase dava para pagar o megaplano de investimento federal que a Administração Obama fez aprovar no Congresso, em 2009, para iniciar a recuperação económica.

O final do prazo de prorrogação das «Bush Tax Cuts» (que Obama acedeu renovar há dois anos, a troco da cedência republicana de prolongar os subsídios de desemprego) e os investimentos congelados desde o acordo feito à última da hora no verão de 2011 para aumentar o teto da dívida (no qual o Presidente teve que ceder às exigências do Tea Party) explicam o risco iminente que urge evitar a todo o custo.

Os especialistas calculam que o pior cenário geraria efeitos terríveis nos indicadores económicos da América: o desemprego (que tem tido quebra ligeira, mas consistente, nos últimos três anos) dispararia para perto dos dez por cento até 2014; o PIB (que na América está a crescer a dois por cento), passaria a ter variação negativa.

No ambiente de crise que se vive neste momento nas principais economias mundiais, se os Estados Unidos caíssem nesse «penhasco orçamental», seria o pesadelo - e a recuperação passaria a ser uma miragem.

Obama, que fundamentou o argumento da reeleição no crescimento e no investimento, tem insistido da ideia de que os cortes fiscais devem passar a incidir na classe média - e que os rendimentos mais altos devem passar a assumir maior fatia no bolo da contenção orçamental.

Mas os republicanos não desarmam na tese de que os sacrifícios se devem distribuir «por todos» e não apenas pelos mais ricos.

Nos dias que se seguiram à eleição, parecia existir uma vontade recíproca entre o Presidente democrata e a Câmara dos Representantes republicana, no sentido de se chegar a um entendimento. «É tempo de se avançar para soluções e para se chegar a entendimentos bipartidários», assumiu Mitt Romney, na própria noite eleitoral. 

Intenções idênticas, com termos quase iguais, foram expostas pelo speaker do Congresso, John Boehner. 

O lado do Presidente também começou por ser de reconciliação. Obama, no seu discurso de vitória a 6 de novembro, lembrou que «estamos todos juntos nisto, independentemente de sermos democratas ou republicanos: vencemos ou afundamo-nos, juntos, como país». 

Só que o avançar das negociações tem reforçado as posições divergentes. O trabalho feito pelo «gangue dos seis» (três senadores da ala liberal dos democratas, três senadores republicanos conservadores) prévio às eleições, esteve longe de ser suficiente para que se chegasse a um acordo - e disso tiveram também culpa os dois candidatos presidenciais, que optaram por relegar a fiscal cliff para o último plano da agenda da discussão eleitoral.

Divergências à parte, Obama e Bohner estão de acordo numa coisa: urge chegar à tal «grand bargain» que permita reduzir em cerca de 4 biliões de dólares a dívida americana na próxima década.

domingo, 25 de novembro de 2012

Histórias da Casa Branca: o dilema dos republicanos

TEXTO PUBLICADO NO SITE TVI24.PT, A 23 DE NOVEMBRO DE 2012:

Mitt Romney perdeu porque não fez uma boa campanha ou porque foi a escolha errada do campo republicano?

Duas semanas depois das eleições que confirmaram a reeleição de Obama, a discussão está lançada no interior do Partido Republicano.

Mesmo antes do desaire eleitoral (recuperação falhada da Casa Branca, aumento de desvantagem para os democratas no Senado e quebra no avanço na Câmara dos Representantes), havia sinais de desconforto no Partido Republicano.

A derrota de Romney não se explica nos últimos dias de campanha - embora seja claro que Obama venceu o sprint final (com o aproveitamento eleitoral do Sandy e com a eficácia da ideia para fecho de campanha de que os americanos já sabiam que poderiam confiar no Presidente e ainda não sabiam se poderiam confiar no adversário republicano).

O «teste da confiança», tão importante numa corrida presidencial, foi perdido por Mitt Romney. Depois de meses a guinar para a direita, durante a época de primárias, Romney tentou corrigir o discurso e apelou, na reta final, ao eleitorado do centro - mas já era tarde.

Os resultados negativos de Romney puseram a nu os problemas de contacto com a realidade que o Partido Republicano enfrenta. 

Excessivamente contagiado pelo radicalismo do Tea Party (que usou os 86 lugares obtidos no Congresso em novembro de 2010 para estender a sua influência nos temas que dominaram as primárias), o «Grand Old Party» perdeu algumas das características que faziam dele um referencial do sistema político americano. 

A escolha de Romney como nomeado presidencial em 2012 parecia ser um sinal de ajustamento num partido com tendência da radicalização à direita nos últimos anos. 

Mas não foi totalmente assim. O que se verificou foi que Romney - um político pragmático que até governara um dos estados mais liberais dos Estados Unidos - teve que infletir à direita em temas como a imigração ou políticas fiscais para conseguir amainar a raiva da ala radical. 

É certo que quem venceu a nomeação republicana foi o candidato menos radical - mas foram tantos meses perdidos em disparates como o local de nascimento de Obama que já não havia credibilidade para roubar votos a segmentos que estavam desiludidos com o primeiro mandato presidencial de Obama.

Isso foi particularmente penalizador para os interesses eleitorais dos republicanos em segmentos como os hispânicos. Romney conseguiu ter menos votos do que McCain nos latinos - muito por culpa do que disse nas primárias sobre imigração (mostrou-se favorável ao conceito de «auto-deportação» defendido no Arizona, que torna tão miseráveis as condições de vida dos imigrantes que os faz querer sair voluntariamente dos EUA).

Como notou Carlos Gutierrez, hispânico e secretário do Comércio na Administração Bush, em declarações à CNN, «nós, republicanos, perdemos esta eleição por causa da direita radical, que assumiu um protagonismo que nunca deveria ter tido. Somos o partido da prosperidade, do crescimento e da tolerância. Os emigrantes que vêm para a América correm riscos, querem trabalhar e acreditam no Sonho Americano. Querem fazer parte dele». 

Posições como as que foram defendidas por Donald Trump, Sarah Palin, Michele Bachmann, Herman Cain ou Rick Santorum condicionaram a campanha de Mitt Romney e assustaram a tal «vasta coligação» que reelegeu Obama.

Há, também, culpas a assacar a figuras republicanas moderadas, que preferiram ficar na sombra ou deixaram colocar-se para segundo plano na discussão: Mitch Daniels, Rudy Giuliani, Jeb Bush ou mesmo Tim Pawlenty e Jon Huntsman (embora estes dois ainda tenham tentado candidaturas presidenciais). 

Jeb Bush, que governou a Florida - casado com uma hispânica e irmão de um ex-Presidente que soube chegar ao eleitorado latino (George W. Bush) - pode ser uma solução republicana a ter em conta nos próximos anos. 

Histórias da Casa Branca: minorias em mutação


TEXTO PUBLICADO NO SITE TVI24.PT, A 20 DE NOVEMBRO DE 2012:
O triunfo de Barack Obama, há duas semanas, foi mais folgado do que muitos anteviram. Uma das explicações para a vitória clara do candidato democrata tem a ver com a demografia.

A reeleição provou à evidência que os republicanos têm um problema com as minorias. E um sério dilema a resolver nos próximos anos.

Os indicadores económicos na América fariam apontar para um período de particulares dificuldades para o Presidente. Com um desemprego nos 7.9%, e uma taxa de aprovação quase sempre abaixo dos 50%, Obama parecia ter as probabilidades de reeleição contra si.

Só que a demografia jogou fortemente a favor do campo democrata. Há 16 anos, quando Bill Clinton obteve a reeleição perante o republicano Bob Dole, em cada 100 americanos que votaram, 88 eram brancos. Na eleição realizada há duas semanas, essa percentagem baixou para 72.

Se Romney venceu na fatia dos 72% de «eleitorado branco tradicional», a verdade é que Obama conseguiu, ainda assim, obter perto de quatro em cada dez votos nesse segmento ainda maioritário. E a questão é que o Presidente arrasou nos 28% de «não brancos»: teve 71% do voto hispânico, 93% do voto negro, 76% do voto asiático.

A distribuição por segmentos na América está a conhecer mudanças profundas. E a forma como o Partido Republicano continua a endereçar questões como a imigração, os direitos dos homossexuais ou o aborto limita-lhes a disputa de eleitorados cada vez mais importantes: hispânicos, negros, mulheres, minorias sexuais.

Durante a campanha presidencial que opôs Obama a Romney, os especialistas em sondagens identificaram rapidamente uma clara vantagem do democrata no eleitorado feminino, mas com uma especial incidência nas «mulheres solteiras com formação».

A diferença nesse segmento era tão acentuada - contrastando com uma pequena vantagem de Romney nas mulheres casadas e mais velhas - que um influente estratega republicano comentou: «A solução passa por casar, rapidamente, um grande número de mulheres americanas».

À parte a tirada bem construída, a verdade é que há fundamento na ideia do estratega republicano: é que a atual realidade demográfica, que beneficiou tão claramente Obama em 2012, pode mudar.

Um olhar mais demorado pelos segmentos que favoreceram Obama ajuda-nos a perceber essa tendência: os jovens, com o passar dos anos, tendem a ter comportamentos eleitorais mais conservadores; as mulheres solteiras, como notou o estratega republicano, podem casar, constituir família e passar a olhar para valores onde os republicanos são mais fortes.

É isso que torna a análise do comportamento eleitoral na América tão difícil e, ao mesmo tempo, tão fascinante. Nunca há uma «maioria permanente» num país tão flexível do ponto de vista da sua mobilidade social.

A «vasta coligação» que reelegeu Obama decorre da incrível eficácia que a máquina eleitoral que suporta o Presidente junto das «minorias em mutação» na América.

Mas isso não quer dizer que os republicanos estejam condenados pela demografia em próximas eleições. A reflexão interna no Partido Republicano terá que passar por este tipo de questões: como recuperar o voto latino (que nos anos Bush era dos republicanos, sobretudo na Florida)?; como integrar a discussão política sobre o aborto sem assustar as mulheres?; como voltar a ter um discurso centrista?

Nomes como Marco Rubio (senador hispânico da Florida, de apenas 41 anos), Nikky Randhawa Haley (governadora da Carolina do Sul, 40 anos, de ascendência indiana), Bobby Jindal (governador da Luisiana, 41 anos, filho de indianos) ou Susana Martinez (governadora do Novo México, hispânica) vão ser muito falados nos próximos tempos.

«Se queremos que as pessoas gostem de nós, temos que, primeiro, que ser nós a gostar delas», assumiu Jindal em entrevista à FOX News.

Os próximos tempos na Direita americana vão ser animados.

domingo, 18 de novembro de 2012

Histórias da Casa Branca: a grande coligação de Obama


TEXTO PUBLICADO NO SITE TVI24.PT, A 7 DE NOVEMBRO DE 2012:

Barack Obama obteve uma enorme vitória no Colégio Eleitoral (acima do que os próprios democratas esperariam) e venceu o voto popular à tangente, com uma margem de 2,6 milhões de sufrágios, num universo de perto de 117 milhões de votantes.

O Presidente obteve a reeleição, graças a uma estratégia eleitoral exemplarmente pensada e concretizada.

Não foi um triunfo tão esmagador como o de há quatro anos, mas foi bem mais folgado do que seria de esperar para quem, desde 2008, teve níveis de aprovação quase sempre abaixo dos 50 por cento e governou em periodo de desemprego elevado.

O grande triunfo de ontem provou, essencialmente, duas coisas: que Barack Obama continua a ser um fenómeno de «likability» que ultrapassa o mero jogo político e, sobretudo, que a máquina eleitoral de Obama é uma das organizações políticas e mediáticas mais bem montadas das democracias modernas.

Obama ganhou claramente o «jogo de xadrez» que é uma corrida presidencial americana. Fez as apostas certas no plano eleitoral, ao colocar todas as fichas em battleground states como o Ohio, o Wisconsin e o Iowa e conquistou no terreno o desafio da mobilização.

Tal como em 2008, a maioria presidencial que confirmou Barack Obama mais quatro anos na Casa Branca é uma «vasta coligação de segmentos específicos»: mulheres (55% preferiram Obama), latinos (71%), jovens (60%), negros (90%).

Mitt Romney só conseguiu roubar o Indiana e a Carolina do Norte a maioria de Obama-2008, mas perdeu todas as batalhas decisivas.

Teve um discurso de derrota responsável e digno, na linha dos candidatos perdedores que percebem a lógica do sistema de poder presidencial e apelou à base republicana para que compreenda que a legitimidade de Obama saiu reforçada e e incontestável.

Esta derrota deve provocar uma profunda discussão interna no Partido Republicano. Os resultados de 6 de novembro provam que a direita americana esta a perder a batalha demográfica.

Os republicanos têm um problema com as minorias e isso, a médio prazo, pode custar-lhes uma desvantagem estrutural em relação aos democratas.

Uma análise pela distribuição de votos por segmentos ajuda-nos a perceber o que está em causa.

Barack Obama arrasou Mitt Romney no voto latino por 71-29. O crescente peso dos hispânicos no total do voto nacional (mas sobretudo na decisão de alguns estados, como o Colorado ou mesmo a Flórida), é algo com que os republicanos vão ter que lidar.

Mitt Romney tentou uma aproximação ao eleitorado latino na fase final da eleição. Mas já foi tarde. O que o nomeado republicano disse sobre a lei de imigração no Arizona foi assustador para os eleitores latinos. Apesar do desapontamento que muitos sentiram com o primeiro mandato de Obama, a verdade é que os hispânicos reforçaram o apoio eleitoral ao Presidente.

Obama foi mestre nesse jogo de forças com Romney, na reta final da campanha, ao repetir a ideia, nos comícios dos dias derradeiros: «Vocês conhecem-me. Sabem que podem confiar em mim. Não concordam, certamente, com tudo o que eu fiz. Mas isso nem a Michelle concorda. Mas sabem que podem confiar em mim».

O problema de Romney, neste seu longo trajeto de campanha presidencial, que durou seis anos (entre a preparação das primárias de 2008, iniciada em 2006, e a eleição de 2012) e que mudou tanto de posição entre uma abordagem centrista e uma perspetiva conservadora, que os eleitores ficaram sem saber com o que podiam contar.

Histórias da Casa Branca: novo ambiente ou mais do mesmo?

TEXTO PUBLICADO NO SITE TVI24.PT, A 7 DE NOVEMBRO DE 2012:

O triunfo claro de Barack Obama no Colégio Eleitoral pode comportar um risco: o de se achar que a América passou a estar unida em torno do seu Presidente.

Quem olhe para as imagens de festa em Chicago e em Washington, na noite eleitoral, pode ser induzido a pensar assim. Sucede que essa ideia é completamente errada.

Os Estados Unidos continuam divididos 50/50 - e os resultados de 6 de novembro até o confirmaram. No mesmo dia em que reelegeram Barack Obama para a Casa Branca, os americanos renovaram a confiança nos republicanos na Câmara dos Representantes e nos democratas para o Senado.

Quer isto dizer que teremos, pelo menos até às intercalares de 2014, uma governação dividida, a exemplo do que aconteceu desde 2010.

O próprio escrutínio presidencial não foi assim tão claro a favor de Obama. Enquanto o Presidente arrasava Mitt Romney na soma dos estados, o voto popular teve resultado apertado: uma diferença de apenas 2,6 milhões de votos num universo de 117 milhões.

Mesmo assim, a reeleição de Obama sem a contestação dos republicanos quanto a eventuais irregularidades nos estados decisivos deu ao Presidente uma legitimidade reforçada.

A questão que se coloca é se esse novo fôlego de Obama irá proporcionar um novo ambiente, de maior distensão, em Washington.

Há fortes razoes para duvidarmos desta tese. Mesmo que possa estar a iniciar um processo interno de reflexão sobre a necessidade de recentrar o seu discurso, o Partido Republicano continuara a fazer um jogo de bloqueio à agenda legislativa do Presidente.

E atenção a «Fiscal Cliff» que ameaça a sustentabilidade das contas americanas. Até dezembro, o Congresso tem que chegar a um acordo que evite a queda dos EUA num «penhasco fiscal».

O tema foi estrategicamente ignorado pelos dois campos na discussão da campanha presidencial que ontem terminou. Mas o relógio já esta a contar e o «gangue dos seis» (três congressistas democratas, outros três republicanos) ainda não conseguiu apresentar um acordo bipartidário que aponte uma solução durável.

Barack Obama, que na reta final da campanha recordou nos comícios que as tremendas dificuldades que apanhou no primeiro mandato ate lhe fizeram ganhar cabelos brancos, fez um discurso de vitoria a reforçar a questão da «reconciliação» e da «união dos americanos» («we are all in this together»).

Curiosamente, Mitt Romney apontou para ideia idêntica no discurso de concessão, lembrando que «é tempo dos políticos em Washington se entenderem para que as coisas se possam fazer»..

O tom de paralisação que marcou uma boa parte dos últimos quatro anos obriga-nos a olhar para estas intenções com muitas reservas.

Seja como for, a discussão em Washington já esta lançada, no rescaldo da noite eleitoral que reelegeu Obama: haverá condições para um novo ambiente politico que alivie o sistema de perigos ainda maiores, ou os resultados acabaram por ser «mais do mesmo», após uma campanha que custou seis mil milhões de dólares?

Histórias da Casa Branca: em busca dos 270 Grandes Eleitores



TEXTO PUBLICADO NO SITE TVI24.PT, A 6 DE NOVEMBRO DE 2012:

Os norte-americanos vão escolher o seu presidente para os próximos quatro anos, mas até pode acontecer que o candidato eleito não seja aquele que tiver mais votos, a nível nacional.

O sistema eleitoral americano preserva as raízes da sua fundação. Há 236 anos, fazia sentido estabelecer um modelo que permitisse que os estados atribuíssem poderes especiais de representação a «Grandes Eleitores» indicados para apontar, em Washington, a preferência de cada território sobre quem deveria ser o Presidente dos Estados Unidos.

Vivia-se num tempo em que as comunidades estavam distantes e isoladas. Não havia comunicações e as condições para um sufrágio universal eram complicadas. Quase dois séculos e meio depois, na sociedade de comunicação em tempo real em que vivemos, já não fará muito sentido manter um sistema que não atribui a vitória a contagem final do voto popular a nível nacional, mas a soma dos Grandes Eleitores dos 50 estados da União.

Al Gore que o diga: em 2000, teve mais 500 mil votos que George W. Bush no voto popular, mas perdeu para o republicano por 271-266 no Colégio Eleitoral -- e, por isso, foi Bush o eleito.

Como é que isso foi possível? Porque o Colégio Eleitoral que elege o Presidente tem 538 Grandes Eleitores decorrentes de pesos diferentes dos estados, em função da sua importância populacional.

A Califórnia, o Texas e Nova Iorque são os estados com direito a mais Grandes Eleitores (por serem os mais populosos), mas curiosamente não são battlegroud states, porque não são eleitoralmente competitivos: Califórnia e NY votam sempre democrata nas eleições presidenciais, enquanto o Texas e sempre republicano.

Na busca dos 270 Grandes Eleitores, swing states de dimensão media, como a Florida (29), a Pensilvânia (20), o Ohio (18), Michigan (16) ou a Virgínia (13) e que decidem verdadeiramente a eleição.

Os dois candidatos passaram as ultimas horas da campanha a saltitar de estado decisivo em estado decisivo, num «final push» que terá mais um efeito psicológico do que, propriamente, de potencial alteração eleitoral.

Nesta louca maratona, Mitt Romney visitou o Ohio por... 43 vezes e Barack Obama em 31 ocasiões. Só mesmo na América.

Mesmo na reta de meta, o Presidente escolheu para fechar três estados que serão os mais importantes na suafirewall para segurar a reeleição: Ohio, claro, mas também Wisconsin e Iowa.

A escolha do Iowa para o fecho da campanha foi profundamente simbólica: foi nesse pequeno estado do Midwest que, nas primárias de há quatro anos e meio, Obama teve a primeira de muitas vitorias que o levou a eleição em 2008.

Romney optou por fazer campanha mesmo no dia da eleição, num sinal de que acredita, até ao ultimo minuto, na ultrapassagem ao Presidente nos estados decisivos.

Obama preferiu não fazer qualquer ação de campanha durante o dia. Em vez disso, optou por fazer algo que adora: jogar basquete, num pequeno intervalo de lazer entre uma campanha desgastante e uma noite eleitoral que promete ser longa e pode vir a ser tensa.

Além da disputa presidencial, esta noite está também em jogo toda a Câmara dos Representantes e um terço do Senado, além das eleições para os governadores. Prevê-se que a House se mantenha sob controlo republicano. Em relação ao Senado, o mais provável é que os democratas mantenham uma curta maioria.

Histórias da Casa Branca: a grande decisão



TEXTO PUBLICADO NO SITE TVI24.PT, A 6 DE NOVEMBRO DE 2012:

Barack Hussein Obama II, 51 anos, democrata, Presidente dos Estados Unidos da América, e Willard Mitt Romney, 65 anos, republicano, ex-governador do Massachussets, vão hoje a votos e pedem aos americanos um mandato para ocupar a Casa Branca ate janeiro de 2017.

Todas as sondagens apontam para uma corrida disputada a pele, com um empate quase absoluto nos números nacionais e uma ligeira vantagem para o Presidente nas contas do Colégio Eleitoral.

Depois de quase dois anos de campanha do lado republicano (e uma eventual vantagem no campo democrata pelo facto de Obama não ter tido que passar por uma temporada de primárias), a corrida chega ao fim... ainda mais empatada do que começou.

Barack Obama manteve um avanço de alguns pontos nas sondagens, atá a oficialização da nomeação de Mitt Romney.

Ultrapassada a divisão do campo republicano, Romney recuperou depois do verão e passou a estar taco-a-taco com o Presidente.

As convenções partidárias tiveram saldo favorável para Obama, que após o discurso de Bill Clinton em Charlotte descolou para uma vantagem de seis a nove pontos. Faltavam, na altura, dois meses e as coisas começavam a parecer mais ou menos definidas.

Só que chegou o primeiro debate presidencial e esse foi o turning point desta longa corrida. Seria a última chamada para um Mitt Romney que tardava a afirmar-se como «presidenciavel». E o republicano venceu, claramente, um Barack Obama abaixo do normal.

O campo republicano ganhou momentum, chegou mesmo a passar para a frente das sondagens nacionais. Mas mesmo nessa fase mais difícil, o campo de Obama mostrou-se sempre muito confiante de se sair bem nos estados decisivos.

O Ohio afirma-se como a firewall da reeleição de Obama. O Presidente tem, no buckeye state, números superiores a outros estados em segmentos que lhe são particularmente difíceis, como os homens brancos ou o eleitorado mais velho.

Melhor nos dois debates restantes, Barack Obama recuperou nas duas ultimas semanas da corrida e pode estar a beneficiar também da boa resposta mediática que teve a «super tempestade» Sandy, que devastou a Nova Jérsia e deixou estragos profundos no nordeste da América.

Obama adquiriu, nos dias finais, mais trunfos que Romney: os endorsments de Colin Powell e Mike Bloomberg; os elogios sentidos de Chris Christie, que terá sido a primeira escolha Romney para a vice-presidencia; uma nova oportunidade de «liderar uma megacrise» , no pós-Sandy.

Na reta final, Romney apelou aos independentes, recordou os falhanços de Obama e moderou o discurso, prometendo «chamar os democratas para consensos», de modo a assumir-se como o candidato que pode «por Washington a funcionar».

Com empate técnico nas sondagens nacionais, nunca a batalha pelos estados decisivos foi tão importante. Será outra vez o Ohio, mas também a Florida, o Wisconsin, o Iowa e a Virgínia. E os esforços finais de Romney na Pensilvânia e no Michigan (dois estados que chegaram a ser dados como certos para Obama) parecem ser fundamentados.

A rota de Obama para os 270 Grandes Eleitores e mais fácil de traçar - mas tudo pode acontecer.

O equilíbrio e tanto que muitos prevêem um pesadelo pós-eleitoral, com recontagens em vários estados. No atual momento da América, isso seria o pior que poderia acontecer.

Histórias da Casa Branca: o estado da corrida


Texto publicado a 5 de novembro de 2012, no site tvi24.pt


HISTÓRIAS DA CASA BRANCA: O ESTADO DA CORRIDA

Redacção, Germano Almeida, em Washington D.C.*
Uma eleição presidencial norte-americana é uma maratona de quase dois anos, em que os dois candidatos têm que reunir apoios, montar logísticas, somar dinheiro e disputar argumentos.

Mas há um fator que, por vezes, é subestimado e que poderá ser decisivo na definição desta eleição tão renhida: a matemática.

Isso mesmo: quem quiser ser eleito Presidente dos EUA, tem que saber jogar com a matemática eleitoral dos estados em disputa. E, nesse plano, a campanha de Obama andou sempre um pouco à frente da de Romney - em parte também pela vantagem que teve de não ter que disputar uma longa e desgastante época de primárias.

Ohio, Ohio, Ohio. Mas também a Florida e a Virgínia. Obama tem uma rota muito mais facilitada para atingir os 270 Grandes EleitoresNa véspera da grande decisão, os números apontam para uma corrida renhida, mas para uma vantagem de Barack Obama no Colégio Eleitoral. Dos 538 Grandes Eleitores em disputa, e eleito Presidente quem somar pelo menos 270.

A questão está, por isso, em perceber que rota tem os dois candidatos para chegar a esse número mágico que garante a eleição para a Casa Branca.

As contas para o Presidente são bem mais fáceis de se fazer. Parte de uma base de 201 Grandes Eleitores e tem várias opções para ultrapassar a barreira dos 270. Com o Ohio, será bem mais fácil. Se ganhar o buckeye state, Obama soma 18 votos eleitorais, que a par das prováveis vitórias no Michigan (16), Iowa (6), Wisconsin (10) e Pensilvânia (20), perfaz 271.

Mas há mais opções vantajosas para o Presidente. Ainda poderá pôr na calculadora os quatro votos eleitorais do New Hampshire (corrida empatada, mas com mínima vantagem de Obama), Virgínia (13 votos, ligeira vantagem de Obama), Nevada (6 votos, ligeira vantagem de Obama), Colorado (9 votos, empate técnico), Carolina do Norte (15 votos, mínima vantagem de Romney) e, é claro, a Flórida (29 votos, mínima vantagem de Romney, com Obama a aparecer à frente em algumas sondagens nos últimos dias).

Quer isto dizer que quem vencer no Ohio, provavelmente ganha a eleição. Mas quer, sobretudo, dizer que Obama tem um caminho muito mais facilitado para a eleição do que Romney, mesmo que falhe o mais desejado dos battleground states.

Para Romney, o quadro é bem mais complexo. O republicano está obrigado a ganhar no Ohio, uma vez que não se afigura nada provável na Pensilvênia, no Wisconsin e no Michigan. E Romney tem outromust-win-state: a Flórida. Se perder no sunshine state, perderá, certamente, a eleição - mesmo que ainda consiga puxar o Ohio para a coluna republicana.

Romney recuperou, nos últimos dias, em estados como o Nevada, o Colorado, o New Hampshire ou o Iowa. Mas mesmo que vença estas quatro batalhas (cenário quase impossível, o mais provável é que consiga obter um ou dois desses estados no máximo), isso não lhe chega para atingir os 270. Nenhum republicano foi eleito Presidente sem vencer no Ohio. Mesmo que Romney o consiga, isso pode não chegar.

E há o caso especial da Virgínia. Obama terminou, em 2008, com um jejum democrata de 44 anos. Desta vez, prevê-se duelo muito renhido. Se o Presidente mantiver a Virgínia, uma recuperação de última hora de Romney no Ohio pode ser inútil para os republicanos.

Histórias da Casa Branca: desta vez, sem paixão

TEXTO PUBLICADO NO SITE TVI24.PT, A 5 DE NOVEMBRO DE 2012:

Barack Obama até parece estar em boa posição de ser reeleito amanhá, para mais quatro anos como Presidente dos Estados Unidos.

Mas é indiscutível que o love affair entre Obama e os americanos há muito que terminou.

Há precisamente quatro anos, nos dias finais da histórica eleição do primeiro Presidente negro da história dos EUA, somavam-se artigos de jornal e peças televisivas que colocavam Barack Obama como «o novo Kennedy», apontando o então senador do Illinois como o herdeiro do «sonho americano alimentado por Jack e Bobby Kennedy».

Quatro anos depois, o ambiente em torno da campanha de reeleição de Obama é completamente diferente. Algo não correu como muitos imaginaram.

Wally Dean, antigo apresentador, repórter e produtor-executivo da CBS News, cobriu várias campanhas presidenciais, desde 1968.

Em conversa com o tvi24.pt, Wally Dean realça a inquietação: «Parte tem a ver com o estilo. Parte possivelmente terá a ver com o caráter. Temos que olhar Robert F. Kennedy como administrador e como procurador-geral. Ele também dirigiu a campanha presidencial do irmão. A questão da guerra, da pobreza, ele interessava-se sinceramente pela pobreza, isso sentia-se... Obama parece-me mais um manager. Ele não transmite tanta paixão como RFK. Obama mostra uma abordagem mais intelectual. Um pouco como Romney, curiosamente, que mostra o seu lado empresarial. São ambos muito racionais. A questão é: isso significa mesmo menos paixão, ou significa apenas que Obama aborda a sua paixão com intelecto?»

«Curiosamente», nota Wally Dean, «Bill Clinton, que parece cada vez melhor aos olhos das pessoas, era uma combinação dos dois. Ligava-se as pessoas, mas quando queria, podia ser muito frio também. Muito focado no que queria ser. Bill juntava as duas coisas: a parte intelectual com a ligação emocional, como fez no discurso a favor de Obama na Convenção. Não vi isso nem em Obama nem em Romney nesta campanha».

Com uma eleição tão renhida, será que existe o risco de o vencedor não ser suficientemente reconhecida na sua legitimidade? Dean acredita que o pior cenário não se verificará: «O que seria mau era que houvesse uma grande confusão em torno da decisão final. Desde que o sistema eleitoral garanta uma decisão final, de preferência rápida e clara, não me parece que haja grandes riscos».

Para Wally Dean, «o grande problema está na incerteza. O importante é que o publico compreenda que a eleição é justa, não foi roubada, que foi conduzida honestamente e dentro das regras. Se isso acontecer, o público até pode não ficar contente com o resultado final, mas irá aceitá-lo, como o fez com Bush/Gore, em 2000».

Wally dedicou-se, nos últimos anos, a formação de jornalistas de todo o Mundo. Mas se ainda estivesse no terreno, como repórter, que campanha gostaria de cobrir? «Provavelmente Romney, apesar de a minha preferência ser a de não cobrir o day-by-day campaignin. Romney é o desconhecido, como era Obama há quatro anos. Ainda sinto que não tenho a certeza que o conheça bem. Mas tanto Obama como Romney são personagens muito interessantes».

Das várias campanhas presidenciais que cobriu, qual foi a mais interessante? Wally surpreende na resposta: «Teria sido a que não aconteceu, quando Johnson escolheu não concorrer à reeleição, em 1968. Na altura, as pessoas estavam nas ruas. Mais do que agora. Hoje, há muita preocupação dos americanos com os empregos, o futuro dos filhos, com o rumo do País. Mas em 68 era diferente, as pessoas estavam nas ruas. Na convenção democrata de Chicago, chegou a haver confrontos».

Histórias da Casa Branca: campanhas negativas

TEXTO PUBLICADO NO SITE TVI24.PT, A 4 DE NOVEMBRO DE 2012:

Barack Obama foi eleito em 2008 sob a capa de ser um candidato limpo de ataques aos adversários e com uma proposta de melhorar o ambiente em Washington.

Quatro anos depois, e perante uma das disputas mais renhidas da história das presidenciais americanas, o Presidente tem seguido quase todos os instrumentos que as disputas eleitorais proporcionam na América: anúncios negativos ferozes, resposta e contra-resposta direta ao adversário, uso de aliados políticos como «pitbulls» de combate ao lado opositor (Joe Biden, Debbie Wasserman Schultz, Jennifer Gronholm, David Axelrod, Stephanie Cutter).

Do lado republicano, as munições nunca parecem ser em demasia. Milhões de dólares em anúncios negativos nos estados decisivos, garantindo que Obama quis que a Jeep saísse do Midwest para a China, ou com o relato de um emigrante híngaro que insinua que Obama esta a levar os EUA para o socialismo. Mitt Romney a guinar do radicalismo conservador (nas primárias) a uma súbita moderação pro-classe média (na eleição geral). A FOX News a massacrar os incautos telespetadores com imagens do ataque em Bengasi (que já foi há mês e meio).

Nas principais cadeias televisivas, estrategas dos dois campos não discutem entre si - interrompem-se e gritam. A agressividade está impregnada no ADN dos duelos nacionais na América. E é provável que já não haja caminho para trás.

Denise Li foi produtora-executiva da CBS durante 22 anos, no programa «Face The Nation», apresentado por Bob Schieffer (o moderador do terceiro debate entre Obama e Romney, realizado no passado dia 22 de outubro).

Em conversa com o tvi24.pt, esta antiga especialista da Time para a Asia, Europa, antiga URSS e África (é agora professora de chinês em Georgetown), considera que «este tom negativo é mais ou menos inevitável». «Há muito que as campanhas presidenciais na América são assim. A campanha negativa faz parte da nossa cultura politica. Há muita coisa em jogo e os dois campos chegam a um ponto em que não podem dar-se ao luxo de perder», explica.

Denise admite que se «chegou a um extremo», mas identifica alguns fatores que terão contribuído para este agravamento: «O surgimento do twitter e do facebook aceleraram a batalha da comunicação. Há quatro anos, isso notava-se muito menos. Por outro lado, há tanto dinheiro envolvido, que a capacidade de resposta e quase inevitável».

A antiga produtora da CBS destaca «dados absolutamente novos como o Presidente aceitar participar em Google Hangouts. Isso é fantástico.»

E os media, que papel devem ter no meio desta tempestade negativa? «Os media podem ajudar a contextualizar, com debates, com opiniões. Mas o papel principal é das candidaturas».

Os debates presidenciais continuam a ser um palco importante, mesmo com a dispersão de meios para propagar a mensagem: «São o único momento em que o publico pode tomar contacto com as propostas diretamente da voz dos candidatos, sem qualquer filtro ou desvio. Também por isso, continuam a ter audiência de várias dezenas de milhões de americanos».

Uma campanha presidencial na América dura perto de dois anos - entre o posicionamento dos candidatos, o arranque das primárias, as votações dos estados, a nomeação oficial nas convenções e os meses finais da eleição geral. Não será... tempo a mais? «Faz parte do processo politico», comenta Denise Li. «Há quem considere que é demasiado tempo, mas por outro lado permite as pessoas fazer escolhas. Elas quase que se tornam familiares com os candidatos, tanto tempo eles estão expostos às exigências da campanha».

Faltam 2 DIAS para as eleições presidenciais nos EUA.

Impacto eleitoral do Sandy: argumentos finais

TEXTO PUBLICADO A 3 DE NOVEMBRO DE 2012:

A 72 horas do fecho das urnas, a corrida presidencial norte-americana começou a entrar naquela fase do «vale mesmo tudo».

Nos dias seguintes à tragédia, os dois campos optaram por uma saída da arena eleitoral. Mas a partir de ontem, os estados decisivos voltaram a ser, em pleno, campos de batalha para as duas candidaturas.

No Ohio, a eleição disputa-se condado a condado, voto a voto. O Presidente Obama mantém um avanço curto, mas consistente, nas sondagens do «buckeye state» e os dois campos terão fortes indicadores que apontam para que, já depois do Sandy, Obama tenha cimentado a liderança nesses e noutros estados decisivos.

Com o tempo a esgotar-se, o campo de Mitt Romney começa a dar sinais de algum desespero. É certo que a corrida continua apertada, mas a verdade é que, a confirmarem-se as ultimas sondagens, a campanha republicana só terá hipóteses de eleição se conseguir recuperar entre três a seis pontos percentuais no Ohio - e, mesmo assim, terá que estancar a recuperação de Obama na Florida (de acordo com a sondagem NBC/Wall Street Journak/Marist, o Presidente lidera no Ohio por 51-45 e na Flórida por 49/47).

O último dia e meio mostrou dados um pouco desconcertantes, do lado republicano. Com a corrida em «dead heat» nos três estados mais relevantes (Ohio, Florida e Virginia), Romney tomou a decisão inesperada de ir... à Pensilvânia.

É certo que se trata de um estado com muitos Grandes Eleitores em disputa (20), mas até agora nenhum dos campos colocava, seriamente, a Pensilvênia no terreno dos «swing states» (Obama lidera as sondagens naquele estado, com vantagens entre os 4 e os 9 pontos percentuais).

Porque terá ido Romney à Pensilvânia? «Apenas para confundir os eleitores», garante David Axelrod, conselheiro sénior da campanha de Obama. E.J. Dionne, comentador independente, concorda: «Nesta fase, é preciso mostrar aos eleitores e aos media que ainda se acredita na vitória. A ida de Romney à Pensilvênia teve mais a ver com tática psicológica do que com estratégia eleitoral».

Mas nem tudo tem sido boas noticias para Obama nos últimos dias.

Depois de uma primeira reação emocional (que o Presidente soube agarrar, com a «photo op» com o governador republicano da Nova Jérsia, Chris Christie, e apelos à união de todos os americanos «independentemente de serem democratas ou republicanos»), a situação caótica em Staten Island, Nova Iorque, levantou questões sobre a eficácia da ajuda estadual, mas também federal, em desastres desta dimensão.

O facto de as alterações climáticas terem voltado à agenda politica (motivo para o endorsment de Mike Bloomberg a Obama) e se ter questionado a importância do FEMA favorece eleitoralmente o Presidente e coloca Romney numa situação delicada.

O nomeado republicano chegou a defender a extinção do FEMA e a realocação de verbas destinadas à proteção civil para os estados.

Mas a indignação e gritos desesperados de ajuda que os media americanos difundiram das vitimas de Staten Island (ilha de Nova Iorque arrasada pelo Sandy) podem alimentar a narrativa de que a Administração Obama não esteve à altura dos acontecimentos.

No comício de ontem no Ohio, a campanha de Romney disparou criticas sobre o Presidente. Rudy Giuliani, antigo mayor de Nova Iorque, foi o mais agressivo.

Faltam 3 DIAS para as eleições presidenciais nos EUA.

Impacto eleitoral do Sandy: «gamechamger»

TEXTO PUBLICADO NO SITE TVI24.PT, A 2 DE NOVEMBRO DE 2012:

Seria difícil imaginar o aparecimento de um fator inesperado tão poderoso como o que o Sandy está a fazer a esta corrida presidencial.

Por esta fase, a escassos quatro dias da eleição, era suposto que os candidatos se desdobrassem em múltiplas visitas pelo Ohio, Florida, Virgínia, Pensilvânia, Wisconsin, Iowa, New Hampshire, Nevada, Colorado, Michigan - os estados decisivos.

Fora do terreno, mas ainda mais perto dos eleitores, era também suposto que esta fosse a altura em que os anúncios televisivos aumentassem em número, subissem de tom e, sobretudo, de preço.

Mas a dimensão extraordinária do Sandy gerou uma nova dinâmica para a reta final. O «gamechanger» que todos aguardavam para desempatar a corrida era, afinal, um furacão associado a uma massa de ar frio.

Em vez de dedicarem quase todo o seu tempo à disputa eleitoral, as grandes cadeias televisivas têm dado a maior parte do seu espaço às operações de salvamento e assistência nos locais mais afetados pela «super tempestade» - e investem em histórias comoventes.

Perante estes dados totalmente novos, as campanhas tiveram que adaptar as suas prioridades e a sua mensagem.

Barack Obama tem tido a chamada vantagem-do-candidato-Presidente. Oficialmente, não está na arena da campanha, mas a verdade é que teve, nos últimos dois ou três dias, algumas das melhores oportunidades de captar votos, ao responder com prontidão aos apelos de governadores e mayors de estados e cidades fustigados pela tragédia.

Os elogios de Chris Christie (que endereçou o discurso principal na nomeação presidencial de Mitt Romney) foram um claro sinal de que Obama fez em trocar, por algum tempo, a campanha pela pele de Presidente em ação durante uma megacrise. O endorsment de Michael Bloomberg (mayor de Nova Iorque eleito pelo Partido Republicano, embora com credenciais independentes), por achar que o Presidente da mais garantias de perceber as mudanças climáticas do que Romney, foi outro trunfo ganho por Obama pós-Sandy.

Mas ainda estamos longe de poder sentenciar que Obama teve no Sandy o empurrão decisivo para a reeleição. Muitos analistas têm chamado a atenção para a possibilidade do Sandy gerar uma quebra na mobilização do voto - e todos os indicadores apontam para que uma maior participação eleitoral beneficiaria o Presidente.
Obama corre ainda o risco de apanhar com um «cair na realidade» de muitos eleitores na próxima terça-feira. Depois de um primeiro efeito de união em torno da tragédia, a 6 de novembro já terá passado uma semana sobre o Sandy - e se o trabalho das autoridades necessitar de mais tempo para surtir efeitos, Obama pode vir a sofrer consequências idênticas às que teve Bush com o Katrina. É preciso explicar que a campanha de Obama não parou nos últimos dias. Joe Biden anda no terreno e Bill Clinton tem sido o principal trunfo dos democratas.
Mitt Romney já retomou a estrada e tentou compensar a perda de protagonismo com o envolvimento em ações de apoio e apelos a «donativos a Cruz Vermelha». O republicano destacou o «tom positivo e de unidade» que tem marcado o pos-Sandy.

Internamente, as duas campanhas dão sinais de ainda não terem conseguido perceber completamente que efeitos advirão do Sandy. Há pouco tempo para lançar estratégias novas - e o melhor é tentar executar com eficácia a linha que cada campo decidiu escolher.

Faltam 4 DIAS para as eleições presidenciais nos EUA.

Histórias da Casa Branca: os media gostam de vencedores

TEXTO PUBLICADO NO SITE TVI24.PT, A 2 DE NOVEMBRO DE 2012:

Na guerra de argumentos da política americana, a direita garante que o mainstream media favorece Barack Obama e a esquerda acredita que Mitt Romney se apresenta como um candidato artificial (que fará, se for eleito, o contrário do que esta a dizer na campanha).

Como perceber onde está a razão? Um bom ponto de partida será lembrar-nos da forma como Barack Obama foi tratado em 2008. O então candidato democrata foi capaz de criar uma onda de entusiasmo tão intensa que surgia com uma aura mobilizadora e, nalguns aspetos, mesmo salvifica.

Quatro anos depois, o mesmo homem é retratado de modo completamente diferente. Obama surge como um Presidente que não fez o trabalho todo e como um candidato em sérios problemas de conseguir a reeleição.

As mesmas empresas de comunicação social, os mesmos analistas, traçaram um perfil muito diferente do mesmo politico, em duas campanhas presidenciais. A questão não estará, por isso, num suposto favorecimento à partida, mas no contexto. A política americana é um bom exemplo da frase de Ortega y Gasset, que nos avisa que «o homem é o que são as suas circunstâncias».

Um estudo publicado esta semana no Boston Globe explica que o «bias» (desvio) determinante em 2008 foi a dinâmica de vitória que Obama conseguiu imprimir desde cedo sobre John McCain. O tom positivo em torno da cobertura mediática de Obama há quatro anos decorreu da própria tendência de triunfo do candidato.

O mesmo estudo mostra que a corrida de 2012 tem dados completamente diferentes. Numa primeira fase, Romney foi apresentado pela imprensa como um candidato «pouco convincente», «demasiado rico», «muito artificial», «descolado da realidade».

Subitamente, a imagem de Romney mudou. O que se passou de extraordinário? Uma vitória. Uma rotunda e inesperada vitória no primeiro debate presidencial, em Denver, Colorado, a 3 de outubro. A partir dai, como que por golpe mágico, as «fragilidades» e «contradições» do nomeado republicano passaram para um plano escondido. A vitória era o combustivel que o nomeado republicano precisava - e ela apareceu.

A abordagem moderada que Mitt Romney escolheu fazer na reta final da campanha ajudou a consolidar a nova narrativa criada em torno do nomeado republicano. A campanha de Romney multiplicou, nos últimos dias, anúncios que destacavam frases do candidato, nos debates com Obama, em que Mitt sublinhava a necessidade de «trabalhar com democratas e republicanos», chamando a si os créditos da governação bipartidária que fez no Massachussets.

Nas primárias, os republicanos perguntavam se Mitt Romney seria «suficientemente conservador». Na reta final da eleição, os independentes e democratas desiludidos com Obama questionam se Romney será «suficientemente moderado».

As voltas que uma corrida presidencial norte-americana dá.

Faltam 4 DIAS para as eleições presidenciais nos EUA.

Impacto eleitoral do Sandy: histórias americanas

TEXTO PUBLICADO NO SITE TVI24.PT, A 1 DE NOVEMBRO DE 2012:

O Sandy tem sido, para o pior mas sobretudo para o melhor, uma grande história americana.

Os EUA estão habituados a passar por duras batalhas e momentos difíceis.

A História da América foi construída por Pais Fundadores com visão de futuro e um extraordinário bom senso e teve, nos últimos 236 anos, inúmeras provas de fogo: a Guerra Civil; as baixas sofridas na Coreia, no Vietname, no Iraque, ou no Afegãnistao; o ataque às Torres Gemeas de Nova Iorque e aos centros de poder federal em Washington, no 11 de Setembro; o furacão Katrina que inundou Nova Orleães.

Líderes no poder militar, no saber das universidades e na inovação cientifica e empresarial, os Estados Unidos são -- ao mesmo tempo -- um país muito exposto a tragédias naturais, capazes de causar inúmeras vitimas e danos materiais incálculaveis.

Esta contradição faz com que, em momentos de extrema gravidade como é esta «super tempestade», os EUA mostrem uma incrível capacidade para saírem ainda mais fortes.

Surgido, com tremenda violência, a apenas uma semana de uma eleição presidencial que estava a focar atenções mediáticas há meses e meses, o Sandy ajudou a revelar alguns dos melhores aspetos da América -- que estavam escondidos pela capa de uma disputa eleitoral agressiva.

Quando a altura tinha tudo para ser de divisão partidária, os últimos dias têm provado que, mais uma vez, nos momentos certos os EUA conseguem unir-se no essencial.

Em parte, essa foi uma das mais poderosas bases de argumentação de Barack Obama há quatro anos durante a campanha. O ambiente de hostilidade em Washington, com um Congresso republicano especialmente focado «em evitar um segundo mandato presidencial de Obama» (palavras de Mitch McConnell, líder da minoria republicana no Senado), travou as pretensões conciliatórias do Presidente.

Mas a raiz da ideia forte de Obama tem a ver com o tipo de reação que os americanos estão a ter ao Sandy: afinal de contas, é «mais o que os une do que o que os divide».

Os elogios de Chris Christie à resposta do Presidente são um belo exemplo disso. Christie é o governador do estado da Nova Jérsia. Republicano, apareceu na Convenção de Tampa, na Florida, como um dos principais defensores da nomeação presidencial de Mitt Romney.

Conhecido pelo seu estilo direto e frontal, Chris Christie não teve pejo em considerar que Obama teve «um comportamento maravilhoso» na resposta às consequências terríveis que a passagem do Sandy teve na Nova Jérsia.

O Presidente esteve ontem na Nova Jérsia e o governador republicano recebeu-o de forma emocionada e deixou bem claro que «não era possível Obama ter feito mais para ajudar».

A tão pouco tempo da eleição presidencial, nenhum manual politico aconselharia Christie, forte apoiante de Mitt Romney, a ter este tipo de gratidão para com o adversário democrata.

Mas Chris explicou, ao seu jeito: «Há coisas mais importantes que uma eleição presidencial. O que aconteceu ao meu estado e à minha gente é muito mais importante».

Aos habitantes da Nova Jérsia desolados com a devastação do Sandy, o democrata Obama e o republicano Christie responderam em conjunto: «Vamos regressar mais fortes».

A força da América vê-se em momentos assim.

Faltam 5 DIAS para as eleições presidenciais nos EUA.

Histórias da Casa Branca: palavra mágica é mobilização

TEXTO PUBLICADO NO SITE TVI24.PT, A 1 DE NOVEMBRO DE 2012:

Há quatro anos, Barack Obama venceu folgadamente John McCain porque obteve enormes vitórias em segmentos como os negros (95%), os jovens (70%), os hispânicos (68%) e as mulheres (57%).

Para Obama conseguir a reeleição, bastaria que repetisse um triunfo expressivo na chamada «grande coligação».

Olhando para a tendência das últimas semanas, percebemos que Mitt Romney tem conseguido recuperar o atraso em alguns desses segmentos, sobretudo nas mulheres. Mesmo assim, o candidato democrata continua a obter a preferência da grande maioria em eleitorados que têm um peso cada vez maior no mapa demográfico norte-americano.

A tese segundo a qual o Presidente mantém boas hipóteses de ser reeleito é fundada em duas ideias essenciais: a forte implantação que a sua campanha tem nos estados decisivos e as vantagens que Obama mantém na «grande coligação».

Ora, esta tese só será confirmada nas urnas se a afluência for elevada. As consequências do Sandy e uma certa desilusão de uma boa parte da base de apoio de Obama são dois «cisnes negros» que podem prejudicar o candidato democrata.

O caso de Mitt Romney É praticamente o oposto: tem um eleitorado de base muito fiel (estadoS do Sul e massa central dos EUA, com exceções dos bastiões de Obama no Midwest), terá certamente grande vantagem nos homens brancos, na população com mais de 65 anos e no eleitorado com rendimentos mais elevados.

Nos EUA, o tipo de eleitorado que vota é muito flutuante, O sucesso de Obama em 2008 teve muito a ver com a capacidade de levar às urnas milhões de eleitores que não costumam votar, mas que, pelas suas características, preferem votar no candidato democrata.

Obama, que há quatro anos concorreu à presidência numa plataforma de «esperança, mudança e reconciliação», tem agora uma perspetiva bem mais pragmática, que passa por «garantir que a América não volta aos tempos de Bush». Como nota o escritor e historiador Douglas Brinkley, «mais do que o yes we can, Obama está agora a dizer no you won't. Não, republicanos, vocês não irão conseguir levar a América a recuar em questões como os direitos das mulheres, a saúde ou os direitos das minorias».

Esse tipo de discurso seria, numa situação normal, muito eficaz para chegar à tal «vasta coligação» que elegeu Obama em 2008. Mas Mitt Romney tem sido mestre em focar a mensagem na Economia - e conseguiu captar a preferência de uma boa fatia de independentes que, há quatro anos, estiveram em peso com Obama.

Na matemática eleitoral, o dado mais preocupante para Obama tem sido a preferência dos independentes por Romney. Por muito que o Presidente repita na campanha que «o governador Romney passou por umextreme makeover e já não se pode confiar no que diz», a verdade é que o eleitorado que não está vinculado a nenhum dos campos tem mostrado maior inclinação para a proposta republicana nestas eleições.

Esta eleição está em aberto, mantém empate técnico nas sondagens, mas curiosamente não é uma eleição com muitos indecisos.

A chave para vitoriá está na mobilização. Será essa a palavra mágica a 6 de novembro. 

Faltam 5 DIAS para as eleições presidenciais nos EUA.