domingo, 16 de setembro de 2012

Histórias da Casa Branca: Partilha e cidadania ou sucesso individual?


TEXTO PUBLICADO NO SITE DE A BOLA A 16 DE SETEMBRO DE 2012:


Partilha e cidadania ou sucesso individual?

Por Germano Almeida





«Não achamos que o Governo é a solução para tudo. Mas também não achamos que o Governo é a fonte de todos os problemas. Se rejeitam a ideia de que a promessa desta nação está reservada a alguns, a vossa voz tem de ser ouvida nesta eleição»

BARACK OBAMA, discurso de aceitação da nomeação presidencial democrata, Charlotte, Carolina do Norte



«A Convenção Democrata realizada em Charlotte, na Carolina do Norte, pode ter marcado a descolagem decisiva para a reeleição de Barack Obama.



Depois da oficialização de Mitt Romney como nomeado presidencial republicano, as sondagens mostravam uma corrida empatada. Um estudo CNN/ORC, divulgado no dia do arranque da Convenção Democrata, mostrava um renhido 48/48 entre Obama e Romney.



Este empate surgia depois dos americanos terem ouvido, durante três dias, sobretudo por parte do candidato a vice dos republicanos, Paul Ryan, que «o Presidente Obama atirou a América no endividamento incontrolado e no desemprego histórico».



Mitt Romney não conseguiu tirar da Convenção Republicana os dividendos políticos que pretenderia: foi, aliás, primeiro candidato republicano desde 1964 que não obteve qualquer salto nas sondagens pós-oficialização da nomeação presidencial.



O empate nas sondagens resultava, por isso, não da pujança eleitoral dos republicanos, mas das reservas que o eleitorado potencialmente favorável a Obama ainda mostrava antes da Convenção Democrata.



Duas formas de convencer os indecisos

O discurso de Bill Clinton em Charlotte foi particularmente elogiado – e há fortes razões para que isso tenha acontecido.



O último Presidente democrata antes de Barack Obama ajudou a pôr as coisas em perspetiva e pode ter dado um empurrão decisivo junto de vários segmentos onde Obama arrasou em 2008 e que podem estar em risco, quatro anos depois: os jovens, as mulheres, os hispânicos, os independentes.



Clinton desmontou, um a um, os principais argumentos dos republicanos contra o Presidente.



Recordou que Obama criou «4,5 milhões de empregos e o Congresso dominado republicano criou... zero». Lembrou que a política de criação de emprego desta administração só não foi maior porque foi sempre barrada pela maioria republicana na Câmara dos Representantes («o plano de emprego do Presidente permitia adicionar mais um milhão de postos de trabalho aos 4,5 milhões, mas os republicanos não deixaram») e decretou, naquele estilo que Bill tem de falar ao coração de cada um dos eleitores: «Ouçam com atenção: nenhum presidente, nenhum presidente (nem eu nem qualquer dos meus antecessores), conseguiria, em apenas quatro anos, resolver os problemas que Obama herdou em 2008».



Bill foi especialmente corrosivo em relação ao ticket Romney/Ryan: «O argumento deles é este: nós deixámos isto numa grande confusão. Quem veio a seguir ainda não conseguiu limpar tudo e por isso voltem a pôr-nos lá!» O estilo direto e popular de Clinton levou a assistência em Charlotte ao delírio.



Clinton acusou Romney e Ryan de pretenderem «ir ainda mais longe do que foi Bush nos cortes fiscais às grandes fortunas» e sentenciou: «Se querem uma sociedade ´winner take all`, em que cada um está por si, então votem em Mitt Romney e Paul Ryan. Mas se acreditam que a América deve ser uma sociedade justa e equilibrada, com valores partilhados e oportunidades para todos, então devem votar em Barack Obama e Joe Biden».



Ainda sobre a criação de emprego, Clinton lançou uma contabilidade que deixou a Convenção Democrata em êxtase: «Nos últimos 52 anos, a Casa Branca teve Presidentes republicanos durante 28 anos e Presidentes democratas durante 24. E qual é a contabilidade de empregos? Bom, democratas 42, republicanos 24!»



O Presidente que levou a América à prosperidade económica e deixou os cofres americanos em folgado superavite mostrou-se muito elogioso em relação às escolhas e atitudes de Barack Obama no primeiro mandato: «Ele escolheu para a sua administração sete pessoas que apoiaram a Hillary nas primárias. Céus, ele até escolheu a Hillary! Barack Obama mostrou ser um forte defensor da classe média, ao cortar impostos a 95 por cento dos americanos. Teve coragem ao salvar a indústria automóvel de Detroit e fez aprovar uma Reforma da Saúde, que só não foi maior porque os republicanos não deixaram».



O clima de hostilidade republicana contra Obama foi outro dos temas muito bem explicados por Clinton. Bill, também ele vítima desse ambiente quando foi Presidente, lembrou que se habituou a olhar com respeito para o Partido Republicano «desde que o Presidente Eisenhower mandou tropas americanas para o Arkansas, de modo a responder a um clima de racismo que paralisava uma escola». Elogiou momentos bipartidários de Presidentes como George W. Bush e reforçou: «Os americanos acreditam na cooperação, não na hostilidade».



Obama reforçou o lado presidencial



Depois desta brilhante defesa da herança presidencial de Obama feita por Bill Clinton, muitos disseram que Barack correria o risco de não ficar com o título de ter o melhor discurso da Convenção Democrata de 2012 (ele, que tinha sido a grande estrela em 2004 e 2008).



Com o trabalho de ataque político já feito nos dias anteriores, Barack Obama optou por um discurso com uma carga mais presidencial: «Há oito anos, eu era um homem mais novo. Era um jovem senador estadual que falava de esperança e mudança. Agora, sou o Presidente», observou Barack.



Mesmo com um registo diferente do de Clinton (mais contido, mais reflexivo e mais distanciado), Obama acabou por ir aos mesmos pontos: contrapondo com a visão republicana de que «o sucesso individual é o mais importante e o peso do governo não se deve meter nisso», a proposta democrata reforça a questão da «sociedade de partilha», em que os valores da cidadania exigem uma visão equilibrada e preocupações em «dar oportunidades para todos».



Obama, que para os republicanos é o Satã do «big government», explicou: «Não achamos que o Governo é a solução para tudo. Mas também não achamos que o Governo é a fonte de todos os problemas. Se rejeitam a ideia de que a promessa desta nação está reservada a alguns, a vossa voz tem de ser ouvida nesta eleição».



Os dias que se seguiram à Convenção Democrata mostraram que a mensagem de Barack Obama e Bill Clinton parece ter passado. Obama aumentou o seu avanço sobre Romney, em valores que, nalgumas sondagens, apontam para uma diferença de sete pontos.



Faltam 51 DIAS para as eleições presidenciais nos Estados Unidos.»

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