sexta-feira, 18 de maio de 2012

Histórias da Casa Branca: Olhar multilateral, mas sempre americano


Barack Obama continua a ser muito popular fora dos EUA, mas como Presidente tem alinhado na esteira de uma forte tradição em Washington de colocar os interesses da América acima de qualquer outra coisa



“Bin Laden está morto e a General Motors está viva”

JOE BIDEN, vice-presidente dos Estados Unidos, destacando as principais conquistas da Administração Obama no último ano


“Em resposta ao turbilhão americano, a atitude do mundo, como seria de esperar, é muitas vezes pesada e resistente, já que os países tentam aproveitar-se ou fugir das consequências. O Presidente Obama percebeu esta resistência e aproveitou-se dela. Internamente, deu resposta à necessidade americana de admiração e aceitação, enquanto externamente deu resposta à necessidade de os Estados Unidos serem mais conciliatórios e menos autoritários (…) Os gestos de Obama tiveram êxito. Os europeus ficaram bastante entusiasmados e muitos americanos ficaram satisfeitos por haver quem gostasse deles novamente. Como é evidente, o entusiasmo dissipou-se rapidamente, à medida que os europeus foram descobrindo que Obama era, afinal de contas, um presidente americano que lutava por objectivos americanos”

GEORGE FRIEDMAN, fundador da STRATFOR, excertos do livro “A Próxima Década”  



Olhar multilateral, mas sempre americano

Por Germano Almeida


Barack Obama foi eleito sob uma plataforma de “mudança” e “reconciliação”. Sobre este segundo conceito, ele estendia-se, no clima de 2008, a uma noção de melhoria do ambiente da política americana (muito marcado pela crispação desde a era Clinton) e também da imagem externa dos Estados Unidos – muito desgastada com o desastre dos últimos anos Bush.

A retórica entusiasmante, e profundamente mobilizadora, de Obama na sua campanha para a Casa Branca extravasou as fronteiras americanas – de tal modo, que se gerou uma expectativa quase transcendente, a nível mundial, em torno do que o 44º Presidente dos Estados Unidos poderia vir a fazer.

Depois do «unilateralismo» dos anos Bush, o novo Presidente prometia uma América mais aberta à diferença, disposta a dialogar e capaz de interpretar o «multilateralismo» como um conceito que não chocava com o papel dominante que os EUA continuam a ter.

Essa percepção tem-se mostrado correcta: no discurso do Cairo, em 2009, Obama deixou clara a diferença entre a «guerra ao terrorismo», proclamada erradamente pelo seu antecessor, e explicitou que «uma minoria de fundamentalistas islâmicos que queriam fazer mal à América não pode ser confundida com o mundo muçulmano». 

Três anos e meio depois de ter sido eleito, parece claro que a imagem externa da América, na forma como os EUA se relacionam com o resto do Mundo, melhorou com Barack Obama na Casa Branca e Hillary Clinton no Departamento de Estado.

Mas, se nos lembrarmos do grau de entusiasmo gerado pelo candidato Obama nos meses que antecederam a sua eleição presidencial, com multidões de 200 mil em Berlim, será forçoso concluir que algo que não correu exactamente como muitos imaginaram. 

A chave para a resposta a esta inquietação está na observação exposta acima, por George Friedman: um presidente americano tem sempre como prioridade os objectivos americanos. 

E Barack Obama, apesar da sua enorme popularidade internacional (maior que a que tem na América, aliás…), não escapa a esse axioma.

Os interesses da América, sempre em primeiro lugar. Quem acompanha mais ao detalhe os discursos do actual Presidente americano, identifica uma certa dualidade na abordagem. 

Nas questões económicas, e mais relacionadas com o emprego, Obama tem uma perspectiva assumidamente americana, que nalguns aspectos até pode ser considerada demasiado protecionista para um líder de um país tão capitalista e aberto ao exterior. 

Por várias vezes, Barack insiste na tecla de «se apostar na indústria americana», em detrimento da produção chinesa, japonesa ou sul-coreana.

Por outro lado, no que se refere à política internacional, Obama tem mostrado especial preocupação em dar à sua administração uma imagem de abertura e capacidade de diálogo. 

Não por acaso, obteve, em tempo recorde, o Prémio Nobel da Paz, apenas nove meses depois de ter sido eleito. Não, certamente, pelo que já tinha feito na altura – mas pela mudança clara de discurso em relação ao seu antecessor.

Sucede que, mesmo nas questões de política externa (matéria em que o Presidente americano tem, por definição, uma zona de intervenção mais imperativa, quando comparada com o apertado sistema de “checks and balances” que limita fortemente a sua acção na frente interna), a verdade é que Barack Obama se tem comportado como um Presidente com uma linha de actuação muito próxima de vários dos seus antecessores.

A retirada do Iraque, surgida como promessa central da sua campanha, teve o contraponto com os erros de Bush como pano de fundo. 

Mas já na questão do Afeganistão, Obama jogou pela cartilha tradicional: acabou por repetir a ‘surge’ feita no Iraque na parte final do mandato do seu antecessor, mostrando agir sob o mesmo paradigma - os Estados Unidos combatem um inimigo externo e tendencialmente invisível, que há que exterminar a todo o custo.

A “guerra de necessidade” que Obama definiu, ao referir-se ao Afeganistão, ajudou a desenhar as diferenças em relação ao atoleiro do Iraque – mas a comparação acaba por colocar estes dois posicionamentos na mesma grelha de análise.

As novas prioridades militares. Barack escolheu, por isso, ser um Presidente dos EUA com as vestes tradicionais de “commander-in-chief”, acabando, com incrível rapidez, com as ilusões da ala pacifista do Partido Democrata, que chegou a apoiá-lo, até à eleição.

Mas soube adaptar-se às circunstâncias destes anos de contenção e aperto: deu cobertura política ao Pentágono para iniciar um ambicioso plano de cortes orçamentais na Defesa, que passa pela redução de efectivos humanos nos diferentes palcos em que os americanos estão envolvidos e onde têm presença militar. O paradigma é, cada vez mais, apostar na tecnologia e menos nos custos humanos das operações militares.

O exemplo máximo dessa transformação é a aposta nos ataques aéreos com ‘drones’ (aviões hi-tech, sem piloto, comandados à distância), cuja utilização no Afeganistão aumentou exponencialmente, durante a Administração Obama.

Além do sucesso retumbante da Operação Geronimo, que redundou na morte de Osama Bin Laden, Barack Obama tem destacado, até como trunfo de campanha, que desde que tomou posse como Presidente, 22 dos 30 elementos da Al Qaeda mais procurados foram eliminados.

Enquanto isso, e como Joe Biden gosta de repetir, «a General Motors está viva», graças ao planos de recuperação para a indústria de Detroit, aprovados no início da Administração Obama – e contra a opinião de republicanos como Mitt Romney. 

Entre os objectivos internos, dominados pela questões económicas, e os desafios externos, ainda condicionados pelas guerras que herdou, Barack Obama dá sempre prioridade aos «interesses americanos». Mesmo que, por vezes, não seja essa a imagem que passa dentro e fora dos EUA.

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