quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Histórias da Casa Branca: Oportunidades e riscos do «split congress»


Barack Obama cumprimenta o congressista republicano John Boehner, do Ohio, novo 'speaker' do Congresso, sob o olhar da sua antecessora, Nancy Pelosi: o momento passou a ser de poder partilhado em Washington



Oportunidades e riscos do «split congress»

Por Germano Almeida


A entrada em funções do 112.º Congresso dos Estados Unidos da América marca o início da segunda metade do mandato presidencial de Barack Obama.

É uma nova fase que apresenta riscos evidentes para o Presidente (pela primeira vez na era Obama, os republicanos têm poder real em Washington), mas que poderá mostrar, também, oportunidades inesperadas para desbloquear muitos dos impasses que mancharam algumas prioridades de Obama, nos seus primeiros dois anos na Casa Branca.

As vitórias legislativas da Administração Obama nas últimas semanas de 2010 (ratificação clara no Capitólio do novo Tratado START, com 13 senadores republicanos a votarem ao lado do Presidente, algo inédito desde Novembro de 2008; revogação do 'don't ask, don't tell'; acordo alargado sobre um novo pacote de medidas fiscais) anunciaram um clima de entendimento bipartidário pouco habitual, atendendo ao ambiente crispado da política americana nos últimos anos.

É certo que tais avanços foram obtidos num período de transição, um pouco híbrido até: já depois da derrota eleitoral dos democratas nas 'midterms' de 2 de Novembro, mas ainda antes da tomada de posse dos novos congressistas.

A esse momento de transição, sempre um pouco estranho, os americanos chamam «lame-duck-session». A imagem do... pato coxo traduz uma certa perda de legitimidade política da maioria democrata no Congresso, nas últimas semanas, perante a vitória eleitoral dos republicanos, a 2 de Novembro passado.

A questão é que esse triunfo não foi tão retumbante como se chegou a prever. O GOP (Grand Old Party) recuperou a maioria na Câmara dos Representantes, mas o Partido Democrata segurou o controlo do Senado, a câmara de elite, por três senadores.

Poder dividido
Teremos, por isso, até ao final do primeiro mandato de Obama, um «split congress». O poder em Washington deixou de estar totalmente nas mãos do partido que apoia o Presidente, é certo, mas também não se assistiu a uma viragem completa, como as que aconteceram em 1982, com Ronald Reagan, e em 1994 com Bill Clinton.

O que é que isto quer dizer? Ainda é um pouco cedo para responder com segurança – mas os sinais das últimas semanas apontam para uma atenuação do clima de hostilidade entre os dois campos partidários que dominam o sistema político americano.

Que não haja, no entanto, ilusões: a intenção principal do campo republicano continuará a passar pelo bloqueio da agenda prioritária da Administração Obama – basta consultar as declarações recentes dos principais líderes do GOP no Congresso.

Mas neste novo tabuleiro de poder dividido, os dois campos serão forçados a encontrar consensos para que possam apresentar alguns resultados nos próximos dois anos.

O congressista republicano John Boehner, do Ohio, é o novo 'speaker' do Congresso. E já apontou a redução da despesa federal como uma das principais bandeiras da nova «House». Mas a travagem do ObamaCare não é um cenário realista: mesmo que a nova maioria republicana avance com um tentativa de revogação da Reforma da Saúde, aprovada no Congresso em Março de 2010, Obama terá sempre o poder de veto – e nunca permitirá que a sua principal vitória legislativa seja posta em causa.

Pelo menos por enquanto, um clima de total hostilidade não parece benéfico para nenhum dos campos. Obama já prometeu «vontade reforçada de cooperar e dialogar» com o lado oposto; os republicanos estão ainda a apalpar terreno, estudando a melhor forma de gerir este «split congress», no qual só têm vantagem na câmara baixa – aquela com maior pendor legislativo, mas que ficará sempre dependente do crivo da câmara alta, o Senado, e da assinatura do Presidente.

E a verdade é que, apesar dos resultados de 2 de Novembro terem anunciado um «regresso dos republicanos», o Senado e a Casa Branca continuam sob o controlo dos democratas.

Pelo meio, há ainda o factor Tea Party. Muitos dos congressistas republicanos que iniciaram funções são afectos aos movimentos radicais de Direita – e podem baralhar ainda mais a estratégia republicana até 2012.

Perspectivas de melhoria
Este novo cenário político em Washington, de contornos ainda por definir, surge numa altura em que os dados começam a ficar um pouco mais animadores para a Presidência Obama.

Nas últimas semanas, a Taxa de Aprovação recuperou ligeiramente – e vai-se aproximando dos 50 por cento, o valor-charneira para que Obama possa enfrentar a reeleição como o favorito natural.

Enquanto do lado republicano a corrida para a nomeação presidencial continua baralhada (com quatro ou cinco pretendentes a obterem valores semelhantes, na casa dos 15/18 por cento), não restam grandes dúvidas de que Barack Obama voltará a ser o nomeado presidencial do Partido Democrata (cerca de 75 por cento dos eleitores democratas consideram que o Presidente deve ser investido pelo seu partido, sem que haja contestação interna).

Na frente económica, a grande inimiga de Obama nos primeiros dois anos, o mês de Dezembro mostrou a criação de 300 mil novos postos de trabalho na América. Há previsões de crescimento nos EUA de três por cento em 2011 e de quatro por cento em 2012 – valores que, a confirmarem-se, poderão ser fortes aliados nas pretensões de reeleição do Presidente.

O momento é de uma certa contradição na política americana. Mas depois da neblina, é muito provável que se perceba que o pior já passou para a Presidência Obama. Os próximos meses poderão desfazer a dúvida.

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